sexta-feira, 3 de agosto de 2007

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(Pont des Arts, Paris)


Há três anos, mais ou menos, atendi um paciente com um tumor que a princípio era considerado benigno. Ele sempre vinha acompanhado de sua esposa, uma mulher gordinha e bastante simpática. No momento da cirurgia, para nossa surpresa, o patologista constatou que o tumor era maligno e eu precisei sair do campo operatório para procurá-la e pedir sua autorização para prosseguir, visto que o tratamento deveria ser mais agressivo. Quando eu disse para ela que o tumor era maligno, ela caiu em prantos. E disse-me que não suportaria passar por tudo novamente. Fiquei sem entender, até que ela me explica que este era seu segundo casamento e que seu primeiro marido havia morrido de câncer. Procurei acalmá-la, afinal nem era um tumor muito agressivo e ele tinha um bom prognóstico, mas ela não se deu por vencida. Após a cirurgia, ela sempre o acompanhou ao consultório nas visitas de rotina, até que um dia ele apareceu sozinho: ela o havia deixado.
-Um belo dia ela me pediu a separação, doutora!, ele me diz.
Na hora eu imaginei que ela não suportaria a idéia de perdê-lo para a doença. Mas como, se nem era um tumor tão agressivo assim, ele faria radioterapia e tinha bom prognóstico?

Há três meses ele retornou com recidiva da doença, completamente inoperável. Muito provavelmente sem chances de fazer outro tratamento que não paliativo. E eu me lembrei dela.

2 comentários:

dade amorim disse...

Vim visitar os pacientes de hoje, de ontem... Deve ser uma experiência bem marcante para os médicos - em especial para aqueles à la Bergman - conviver com a morte com tanta freqüência. É curioso como encaramos a morte no dia-a-dia massacrante da cidade, em que quase só ouvimos falar dela, mas não vemos o que ela deixa para trás. É como se fosse uma realidade distante e até improvável. As pessoas adoram uma boa ilusão.
Beijo, querida.

dade amorim disse...

Vim visitar os pacientes de hoje, de ontem... Deve ser uma experiência bem marcante para os médicos - em especial para aqueles à la Bergman - conviver com a morte com tanta freqüência. É curioso como encaramos a morte no dia-a-dia massacrante da cidade, em que quase só ouvimos falar dela, mas não vemos o que ela deixa para trás. É como se fosse uma realidade distante e até improvável. As pessoas adoram uma boa ilusão.
Beijo, querida.